Terrorismo nutricional: Glúten

Atualmente a mídia e as redes sociais abordam com frequência a eficácia e os benefícios de uma dieta isenta de glúten.

O sensacionalismo em torno de alguns alimentos faz com que ocorra frequentemente um terrorismo nutricional sem, na maioria das vezes, embasamento científico algum.

Mas o que é o glúten então?

O glúten é a principal proteína presente no trigo, aveia, centeio, cevada e no malte, sendo composto por gliadinas e gluteninas. Essas duas frações juntas é que conferem a capacidade absortiva em água, viscosidade e elasticidade às massas preparadas com esses cereais.

Essa proteína não é totalmente digerida no aparelho gastrointestinal e por isso pode causar complicações em situações adversas no organismo de alguns indivíduos. As moléculas de gliadinas não digeridas podem atravessar a barreira do epitélio intestinal e desencadear reações imunomediadas em casos de infecções intestinais, ou, quando a permeabilidade do intestino encontra-se aumentada, causando a famosa doença celíaca.

A doença celíaca é uma doença imunológica desencadeada pelo consumo de glúten, em pessoas geneticamente predispostas, sendo caracterizada por um processo inflamatório na mucosa do intestino delgado, causando a atrofia das vilosidades intestinais, má absorção e várias manifestações clínicas. O tratamento consiste na completa exclusão do glúten da dieta, possibilitando a melhora na qualidade de vida e a redução dos futuros riscos de morbimortalidade. Esses riscos incluem complicações como anemia, infertilidade, osteoporose, e câncer (linfoma intestinal).

Após várias especulações houve um grande alvoroço de que o glúten faria mal à saúde de pessoas não celíacas, e, por isso, deveria ser retirado da dieta. Muitas alegações foram feitas sobre o malefício que causaria a ingestão do glúten como deposição de gordura abdominal, picos de glicemia, aumento das mamas em homens, aumento do apetite, além de doenças graves, como problemas cardíacos e Alzheimer. Tais alegações não comprovadas como essas foram divulgadas por toda a mídia recentemente, contribuindo para o terrorismo nutricional, e, transformando o glúten em um vilão da alimentação contemporânea. Para certos tipos de doenças como a síndrome do intestino irritável, a retirada do glúten da dieta leva ao alívio dos sintomas, porém ainda não há um parecer que tal conduta beneficie pessoas saudáveis.

Algumas pessoas retiram o glúten da dieta não apenas para evitar os problemas citados acima, mas para perder peso, porém não é certeza que em uma dieta sem glúten haverá perda de peso, dependendo da conduta de cada pessoa muitas vezes acontece o oposto. Outro ponto importante a ser abordado é que muitas pessoas tem uma noção equivocada de que os alimentos sem glúten são mais saudáveis e na verdade, em alguns produtos observa-se menor qualidade nutricional em comparação com os convencionas feitos à base de trigo.

Os produtos de panificação sem glúten geralmente contém menos fibra do que um à base de trigo e ainda contém a gordura e o açúcar que estão presentes também na versão convencional. Além disso, alimentos sem glúten também são menos propensos a serem enriquecidos com nutrientes (ferro e ácido fólico).

Toda a especulação formada em volta dessa proteína abriu uma fatia lucrativa na indústria de alimentos, assim como muitos produtos classificados e propagados como mais saudáveis que os convencionais com glúten. Desta forma, produtos sem açúcar, sem glúten e sem lactose têm preços diferenciados no mercado, tornando o termo saudável uma arma poderosa de venda. O problema da exclusão do glúten da dieta sem necessidade é que não há nenhuma evidência que indique benefícios significativos para a população em geral, já que as dietas sem glúten são claramente indicadas para pacientes com doença celíaca ou para pessoas com sensibilidade ao glúten.

Renata Dessordi

Renata Dessordi é nutricionista formada pela Universidade de Ribeirão Preto, especialista em Nutrição Clínica e Esportiva. Mestra em Alimentos e Nutrição pela Unesp. Doutoranda em Alimentos e Nutrição pela USP/Unesp. Auriculoterapeuta Francesa.

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