Os Rejeitados (2023)
A interação entre esses três personagens proporciona um sabor agridoce, uma característica marcante do diretor.
Meu primeiro contato com algum filme do Alexander Payne foi no deslumbrante Nebraska, que concorreu ao Oscar de 2014, desde então se tornou um dos meus filmes favoritos da vida. É lindo como em ambientes e situações diversas, todos os seus filmes ainda se conversam, os desajustados, aqueles que muitas vezes participam de histórias sem grandes importâncias alguma, tomam conta das telas e vivenciam narrativas instigantes, com uma fluidez incrível em seus diálogos que constrói um naturalismo nas cenas, edificando mais as suas narrativas.
Em Os Rejeitados (indicado a 8 Oscar), somos conduzidos pela história de Paul Hunham, um professor de História Antiga interpretado brilhantemente por Paul Giamatti (indicado ao Oscar de melhor ator), conhecido como o educador rigoroso e amplamente detestado pelos alunos e colegas. Ao seu lado, Mary Lamb, vivida por Da’Vine Joy Randolph, que tem conquistado merecidamente diversas premiações como atriz coadjuvante e provavelmente levará o Oscar de atriz coadjuvante deste ano. Mary, chefe da cozinha da escola, enfrenta a dor do luto após a perda de seu filho e opta por não passar as festas de Natal na casa de sua irmã. Devido a alguns acontecimentos, acaba restando apenas um aluno em companhia deles. Angus Tully (Dominic Sessa), um aluno que é abandonado por sua mãe e padrasto durante essa época, que enfrenta questões internas, mas não consegue externar.
A interação entre esses três personagens proporciona um sabor agridoce, uma característica marcante do diretor. Em meio ao amargor da melancolia, surge uma suavidade ao acompanhar essa aventura natalina. Apesar dos clichês típicos de filmes desta época, como os ensinamentos e a importância da companhia, Alexander Payne demonstra que clichês, quando bem utilizados, podem enriquecer uma narrativa. A forma como cada personagem amadurece ao longo da trama, por meio das trocas de vivências e ideais, cria uma aprendizagem conjunta de maneira orgânica e deliciosa de se acompanhar.
A trupe dos rejeitados, é formada por vítimas de um sistema que esmaga o ser humano, independente de sua posição. Paul, após uma injustiça que ocorre em seu meio acadêmico, sendo atacado por aqueles que obtém o poder, a primeira porta que se abre em sua falta de esperança se torna a sua penitência, um trabalho que se torna uma dívida, até chegar o ponto de sua vida externa se apagar e apenas os dias naquele colégio de elite se tornam as suas manhãs e noites. Uma vida amargurada que é maturada a whisky, colecionando páginas pela metade, sem conseguir compreender como os pontos finais de suas escritas podem até alcançar grandes voos.
Mary, não fica fora dessa rede de impunidades diárias que um sistema pode causar, sobrevivendo todos os dias em um árduo trabalho, sofrendo alguns ataques de alunos que pensam ter o direito de humilhar algum trabalhador. Sua única missão era dar um futuro acadêmico para o seu filho, mas ter boas notas e estudar em uma grande escola não foi o suficiente para uma pessoa pobre, restando apenas um caminho para trilhar, o militar. Um Estados Unidos que abriga os supostos filhos para o exército e caminhar ao abismo da morte de mais uma guerra infeliz. A morte de seu filho vem acompanhada do luto e garrafas de whisky, uma mulher que tenta se manter firme e forte, tentando sobreviver todos aqueles dias.
E como elo final do trio está Angus, um jovem carrega consigo uma destruição familiar, gerando várias consequências amargas, uma depressão que se alivia com remédios, rebeldias e expulsões de colégios e, um pai, perdido em doenças psicológicas, que foi o eixo central do desmembramento familiar. Como consequência, sua mãe arranjou um outro marido, uma pessoa que ao lado de seu extenso dinheiro carrega a amargura e o desprezo por Angus. Uma história que se une aos outros dois, camadas que vão se abrindo e demonstrando suas melancolias e fragilidades. Ser humanos em suas essências.
São retratos de uma sociedade afetada pelas consequências das crises dos anos 70 nos Estados Unidos, moldada por poderes corrompidos que são encharcados de dinheiro. Em meio aos abusos que a vida impõe aos personagens, a lente da câmera evita invadi-los, proporcionando espaço para que vivam autenticamente em cena. Aliada a um roteiro que cria diálogos singelos e reais, o resultado final é nada menos que um dos melhores filmes natalinos, sem dúvida presente em minha lista para as futuras celebrações de final de ano.
Ficha Técnica
Direção: Alexander Payne
Roteiro: David Hemingson
Elenco: Paul Giamatti, Dominic Sessa, Da’Vine Joy Randolph, Carrie Preston, Brady Hepner, Ian Dolley, Jim Kaplan, Michael Provost, Andrew Garman, Naheem Garcia, Stephen Thorne, Gillian Vigman, Tate Donovan, Darby Lee-Stack, Bill Mootos, Dustin Tucker, Juanita Pearl, Alexander Cook, Liz Bishop, Cole Tristan Murphy, Will Sussbauer, Carter Shimp
País: EUA
Duração: 133 minutos
Sinopse: Um instrutor rabugento desenvolve um vínculo com um encrenqueiro da escola e a cozinheira-chefe.
NOTA: 5