Apois

De uma margem à outra, caminho longo a ser seguido. Nos primeiros passos tem-se ajuda, até que, mesmo cambaleante, é preciso seguir sozinho. Tem um cá outro lá que às vezes dá apoio, momento pra respiro, depois é só a coragem como companhia. Na travessia, dá pra ver natureza, escutar poesia, encontrar alegria. Mas tem poeira também, sujidade. Daí vem tristeza, agonia, coisa ruim.

Na dança com Deus e o Diabo, os dois impressionam com seus passos. Seguimos. Risadas, choros, corrida, calmaria. Aproxima-se do meio do trajeto. Ai, ai, ai, que dureza, ainda tem tudo isso pra andar. Ajoelha. Caem do céu Rosa, Machado, Bandeira. Chuva grossa que traz calmaria pra dentro. O fora ainda é agitado e perigoso. Nonada, escuta-se. Aceita. O som é de batucada, tum, tum paramparam. Dói é no silêncio, como o escuro que não dá nem pra ver os dedos, é breu. Perde-se.

Mais coragem, levanta-se. Volta a brincar com a curiosidade do porvir, será, será? Anda mais um pouco, chega até a dançar. Retorna a sentir flores e verde, e esculturas e quadros bonitos. Joga-se o passado no rio abaixo, mas água também anda e fica ao lado, de quando em quando em paralelo, outras em direção; alcança de novo e faz estrago. Senta, descansa, olha ao redor, tem coisa bonita. Vem, vem, escuta. O mantra das orações é pirlimpimpim, faz voar. Entrega-se ao voo, vê de cima as águas lá arrastando dores atiradas, vivas, mas longe. Vento bate no rosto suavemente, tem sol gostoso pra esquentar a alma. Pronto! Tem que voltar e caminhar; a outra margem espera.

No caminho, descobre-se como dois, um diferente do outro; um de dentro, outro pra mostrar. Dualidade difícil, quem é quem? Estuda, lê, trabalha, acorda, come, namora, bebe, riso, lágrima, dorme e de novo lê, trabalha, acorda, come, namora, bebe, riso, lágrima, dorme… cansaço. Pensa, organiza, dispõe os pés no caminho, pula, corre até doer todos os músculos. Olha. Ainda falta muito, muito, muito, ou se quiser, nada, nada, nada. Há quem assim prefira. Descanso!