O olhar de duas gerações de mulheres
Matilde Leone, 60, e Mariany Barissa, 13, falam em entrevista exclusiva sobre o papel feminino na sociedade do passado e atual
A ideia de criar o Dia Internacional da Mulher se deu no final do século XIX e início do século XX, isso devido ao contexto das lutas femininas por melhores condições de vida e trabalho, além do direito ao voto.
Na parte ocidental, o Dia Internacional da Mulher foi comemorado durante as décadas de 1910 e 1920. Posteriormente, a data caiu no esquecimento e só foi recuperada pelo movimento feminista, já na década de 1960, sendo, afinal, adotado pelas Nações Unidas, em 1977. A data mantém hoje relevância internacional.
A jornalista Matilde Leone, 60 anos, teve uma adolescência em que não se falava muito dos direitos das mulheres, mas se ressaltava os seus deveres. Também aquela geração não estava ligada em assuntos desse segmento, mas sim em outros. Entretanto não sabiam que mais tarde seriam responsáveis por algumas transformações.
“Na minha adolescência, não se falava muito sobre direitos da mulher aqui no Brasil. Os adolescentes, de um modo geral, estavam ligados em outros assuntos, mas já surgiam algumas transformações que hoje reconhecemos, mas na época, não se dava conta, como a participação das mulheres nos movimentos sociais e políticos, no surgimento da pílula anticoncepcional, no modo de se vestir etc. Acredito que tenham sido caminhos abertos para transformações maiores e para reivindicações mais concretas em relação aos direitos da mulher”, comenta Matilde Leone.
Ela viveu a época da Ditadura e sofreu a forte repressão de um Governo que praticamente não reconhecia as mulheres, mas as conquistas femininas foram muitas, uma vez que elas conseguiam força, garra e coragem para se imporem.
“As conquistas foram muitas ao longo da história como postos de trabalho antes restritos aos homens, leis de proteção contra a violência doméstica como a Maria da Penha, mas não podemos deixar de reconhecer que ainda está muito longe de ser o que as mulheres gostariam. Não custa lembrar que, de uma forma pública ou isolada, as mulheres sempre estiveram atentas à necessidade de reivindicar seus direitos, desafiando padrões em várias épocas, na literatura, na arte, no trabalho etc, como a manifestação de 90 mil mulheres russas por melhores condições de trabalho e de vida, lá em 1917, na marcha que ficou conhecida como Pão e Paz, e vários outros exemplos que a história registra”, relata a jornalista.
Ainda segundo Leone, embora as reivindicações sejam constantes, a violência contra a mulher é algo inquestionável. Os números de agressões e assassinatos de mulheres – geralmente por companheiros, ex-maridos, namorados são assustadores.
Uma pesquisa realizada pelo Datafolha e divulgada na manhã de hoje, aponta que mais de 500 mulheres são vítimas de agressão física a cada hora no Brasil. O estudo ainda aponta que 9% das brasileiras relatam ter levado chutes, batidas ou empurrões no ano passado (o índice sobe para 29% de forem contabilizadas as que sofreram agressões verbais). Entretanto, 52% afirmam que não fizeram nada após os atos.
“Acredito que as mulheres podem encontrar a independência em qualquer campo, mas não dentro de poucos anos. É uma longa jornada que depende não somente das mulheres, mas de toda a sociedade e do desejo também dos homens de se despir de preconceitos arraigados e ver os relacionamentos não como competição, como jogo de braço, mas como oportunidade de encontro de seres humanos que têm os mesmos direitos.
O dia internacional da mulher é uma data de relembrar todos os feitos e lutas pela conquista de um mundo melhor e principalmente para refletir o que as mulheres já conseguiram.
Adolescente quer a ‘quebra’ de tabus
A jovem cravinhense Mariany Barissa, 13 anos, e estudante do 9º ano do Ensino Fundamental, já é de uma nova geração, e que apesar de não sair nas ruas para se manifestar e defender uma causa, acredita que as mulheres já podem inclusive assumir papéis que nas gerações anteriores eram só de homens, inclusive na área tecnológica. Desde pequena ela nunca gostou de brincar com bonecas e quer sim ser uma gamer de renome, e encarar de frente os meninos em qualquer jogo.
“Jogo videogame desde os meus 10 anos, e nunca gostei de bonecas. Sempre me senti atraída por jogos, pois tinha ação, e nunca fui de ficar parada. De repente isso também pode ter acontecido, porque sempre convivi com meninos. Apesar deles não quererem que eu jogasse, sempre os enfrentei e mostrava que poderia ser bem melhor do que eles”, revela Mariany Barissa.
O seu primeiro jogo foi Minecraft, mas se aventurou em CrossFire, League Of Legends, Codename, Cure, entre outros.
“Sempre quis mostrar que as meninas também podem ‘brincar’ de qualquer coisa que os meninos brinquem. Entretanto as minhas amigas não gostam de videogame e jogos, então elas reclamam de mim muitas vezes, porque nem sei muito o que falar com elas”, afirma a jovem.
Entretanto as pessoas de sexo feminino estão a cada dia mais se interessando por videogames, uma pesquisa realizada pela empresa 1000 Store revelou que as mulheres representam 20% dos consumidores desse tipo de produto.
“Os meninos às vezes tem uma certa inveja de uma menina jogar melhor do que um rapaz, isso é o motivo da maior parte das brigas. Mas as meninas estão cada vez mais interessadas em videogames e jogos”, diz a gamer.
Apesar de já ter sido chamada de “menino” por suas amigas, a jovem Mariany espera que as mulheres cada vez tenham espaço em ambientes que antes eram só de homens.
“Espero que os homens cada vez mais aceitem que as mulheres também podem fazer tudo que eles fazem, e ainda algumas vezes melhor. E que as mulheres possam cada vez mais se envolver na política e outros segmentos”, diz Mariany.
Não importa a geração, mas a certeza é que as próprias mulheres querem marcar história na conquista de direitos.