A mania de rotularmos tudo (e todos)

Pare e pense:

Quantas vezes você já rotulou alguém simplesmente pela estética? Quantas vezes você já acreditou em algo apenas porque alguém disse? Quantas vezes você já tomou uma decisão precipitada a respeito de algo ou outro?

Provavelmente tantas vezes que nem conseguimos lembrar, não é mesmo?!

Em nosso mundo não podemos ser metade, temos que ser inteiros! Não podemos oscilar ou ficar em cima do muro, isso não é aceitável! Você é alguém especifico, assim como a outra pessoa também é, mesmo você não fazendo ideia do que ou quem. Pura ilusão não é mesmo?! Como ser sempre por completo? Como ser definido por algo que é mutável? Mas mesmo assim, temos que sempre definir, isso nos dá segurança, é mais cômodo e confortável.

Nossa pressa de ter certeza, de saber o que é, ou quem é, e até mesmo quem somos faz com que paremos de pensar, usamos nossa primeira impressão ou algo apenas visual e já definimos. O tempo de conhecer, de identificar, de prestar atenção, em nossa sociedade hoje não tem espaço para existir. Pra que parar pra conhecer se podemos apenas deduzir e já definir? Pra que se dar o trabalho de pensar, de descobrir?

Se essa definição é “saudável”, se ela dá a identidade que a pessoa acredita e concorda, se é isso que faz sentido pra vida dela, tudo bem. Somos mutáveis, e se essa rotulação for “boa” ela se moldurará com nossas transformações e levara com ela nossas identidades, mas se essa definição não for “legal, ideal ou saudável”, teremos um problema.

A rotulação muitas vezes nos estagna, nós define a apenas uma coisa especifica, e assim “perdemos nosso poder” de mutação, ficamos estigmatizados. Erving Goffman, referência o termo estigma como “um atributo profundamente depreciativo”, ou seja, um indivíduo estigmatizado:

“possui um traço que pode se impor a atenção e afastar aqueles que ele encontra, destruindo a possibilidade de atenção para outros atributos seus”

Porque petista não presta, porque quem tem sofrimento mental é louco e tem que ficar preso, porque criança de rua vira bandido, porque quem mora na favela é traficante, porque quem mora em determinado lugar é bom, porque quem é formado é melhor que quem não é…. Quantas frases vazias que ouvimos…. Quantos porque ditos com tantas certezas, que na verdade, não dizem nada.

Como definir um lugar ou alguém apenas pelo que você imagina? Isso chama preconceito, discriminação. Para falar sobre algo é necessário estudar, conhecer, viver aquilo, não podemos apenas estigmatizar algo. O estigma pode paralisar, ele reduz possiblidades de conhecimento e mudanças, ele faz com que o indivíduo perca seu poder de ação.

Goffman coloca que “fazemos vários tipos de discriminações, através das quais efetivamente, e muitas vezes sem pensar, reduzimos suas chances de vida: Construímos uma teoria do estigma; uma ideologia para explicar a sua inferioridade e dar conta do perigo que ela representa, racionalizando algumas vezes uma animosidade baseada em outras diferenças.”

Aquela antiga frase “Diga-me com quem andas, que te direis quem é”, complicado não?! Será que realmente é assim? As pessoas com quem andamos, os lugares os quais frequentamos, nossa família, casa, trabalho realmente vão nos identificando, dando nossa identidade, mas não é apenas uma coisa, uma pessoa, ou um ambiente que irá definir sua índole e caráter.

Passou da hora de nos permitirmos. Permitirmos conhecer, permitirmos esperar, permitirmos ter tempo, permitirmos viver e permitirmos pensar. Gostamos de ficar em nossa zona de conformo, mas é necessário ver além e mexer-se. Pensar e conhecer abre horizontes jamais imaginados, é transformador, e muitas vezes uma transformação boa.

É necessário respeitar nós mesmos, nos dando tempo para realmente vermos o que somos ou queremos ser, e respeitar o outro, conhecer e parar de querer tudo e todas respostas imediatas. Não somos apenas naquele momento, lugar ou aquela coisa, somos em todos os momentos, lugares e somos muito mais que apenas algo.

Sugestão de leitura

Estigma: Notas sobre a Manipulação de uma Identidade Deteriorada – Erving Goffman

Yasmin Paciulo Capato

Yasmin Paciulo Capato é Psicóloga (CRP: 06 / 136448) clínica e atende as especialidade de Psicoterapia, Orientação Vocacional e Psicodiagnóstico na Clínica Vitalli.

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