Doação de órgãos: um ato de amor que se estende além da morte

Para aumentar o índice de doadores de órgãos é preciso conversar com a família e deixar claro sua vontade em ser doador

A maioria da população já ouviu falar sobre a doação de órgãos, porém esse é um tema pouco discutido entre familiares, sendo assunto debatido somente quando o ente querido vem a falecer.

O presidente da Liga de Transplantes de Órgãos e Tecidos de Ribeirão Preto (LITOT), João Paulo Victorino, acredita que existe um tabu com relação a doação, mas isso pode ser superado se houver a conversa entre os familiares.

João Paulo Victorino, estudante de enfermagem na USP e presidente da Liga de Transplantes de Órgãos e Tecidos de Ribeirão Preto (LITOT)
João Paulo Victorino, estudante de enfermagem na USP e presidente da Liga de Transplantes de Órgãos e Tecidos de Ribeirão Preto (LITOT)

“As pessoas não gostam de falar sobre morte, preferem deixar esse tipo de assunto de lado, e ao banalizá-lo, deixa de manifestar o interesse pela doação, ou até mesmo, se opõem ao assunto por desconhecimento”, conta o presidente da LITOT e também acadêmico do curso de Bacharelado e Licenciatura em Enfermagem da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (EERP-USP).

No Brasil, de acordo com a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos, de cada oito possíveis doadores, apenas um será doador com órgãos transplantados. Enquanto em países como Espanha, referência mundial quando o assunto é doação e transplantes, são registrados acima de 40 doadores (43,4) para cada milhão de população, a taxa brasileira está próxima de 16 (15,9), com desempenho que ainda pode melhorar muito.

Conheça as etapas da doação de órgão
Conheça as etapas da doação de órgão

Diversos fatores contribuem para esse número, mas um dos principais é a recusa familiar. No Brasil, para ser doador, não é preciso deixar nada por escrito, e sim comunicar à sua família, pois somente os parentes podem autorizar a doação.

A doação de órgãos e tecidos pode ocorrer após a constatação de morte encefálica, que é a interrupção irreversível das funções cerebrais, ou em vida. No primeiro caso, o doador é capaz de salvar ou melhorar a qualidade de vida de mais de 20 pessoas, podendo doar córneas, coração, fígado, pulmão, rim, pâncreas, ossos, vasos sanguíneos, pele, tendões e cartilagem.

O doador em vida, por sua vez, deve ter mais de 18 anos e boas condições de saúde. A doação ocorre somente se o transplante não comprometer suas aptidões vitais. Rim, medula óssea e parte do fígado ou pulmão podem ser doados entre cônjuges ou parentes de até quarto grau com compatibilidade sanguínea. No caso de não familiares, a doação só acontece mediante autorização judicial. De acordo com a Aliança Brasileira pela Doação de Órgãos e Tecidos (ADOTE), 50% das mortes encefálicas não são notificadas no Brasil.

O programa nacional de transplantes tem organização exemplar: cada Estado tem uma ‘Central de Notificação, Captação e distribuição de Órgãos’, que coordena a captação e a alocação dos órgãos, baseada na fila única, estadual ou regional.

Regras para a doação de órgãos e tecidos
Regras para a doação de órgãos e tecidos

Os transplantes são a melhor ou a única alternativa para salvar quem está doente dependendo de uma doação para sobreviver. A doação e os transplantes são realizados com sucesso, e possibilita ao paciente uma vida saudável, produtiva e saudável.

“É comum ter medo da morte e não querer se preocupar com esse assunto ainda em vida. Mas é preciso ir além e pensar no próximo, poder ajudar a salvar ou, ao menos, melhorar a saúde de outras”, conta Aline Nardelli, que já manifestou o desejo de ser doadora de órgãos aos seus familiares.

As OPOs (Organizações de Procura de Órgãos) são responsáveis pelo processo de doação e captação de órgãos e tecidos em todo o estado de São Paulo, com atuação em 10 regiões, uma delas é a OPO do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, que atua também nas cidades de Franca, São Carlos, Araraquara, Jaboticabal e Barretos.

Todos os dias da semana (de segunda a sexta-feira), com 24 horas de atuação, a equipe da OPO Ribeirão Preto visita os hospitais da cidade para encontrar possíveis doadores, pacientes internados nas Unidades de Terapias Intensivas (UTI) e Centro de Terapias Intensivas (CTI), e também realizando um trabalho de conscientização junto às famílias dos pacientes.

Segundo Victorino, a doação é importante pois garante a qualidade de vida e recuperação daquelas pessoas que estão na fila de espera por um órgão.

“O transplante para essas pessoas significa a última esperança de continuar vivos, já que somente pela substituição do órgão/tecido lesado que a pessoa poderá se recuperar”, ressalta.

Ser um doador é um gesto de amor que pode salvar muitas vidas, se você quer doar seus órgãos, converse com a sua família, só eles podem autorizar a doação e garantir que a vida continue. O ato é simples, não há registros no RG ou CNH e sem custos financeiros.

Você sabia que mais de 30 mil brasileiros aguardam na fila a espera de um transplante?

Como mudar esse cenário e permitir que cada vez mais pessoas que estão na fila de transplantes possam voltar a desfrutar de uma vida confortável? É importante saber que:

  • Se você está doente ou ferido e foi admitido no hospital, a prioridade número um é salvar a sua vida. A doação de órgãos somente será considerada após sua morte e após o consentimento de sua família;
  • As religiões enxergam a doação como um ato de caridade e amor ao próximo;
  • Pessoas de todas as idades e históricos médicos podem ser consideradas possíveis doadoras. Sua condição médica no momento da morte determinará quais órgãos e tecidos poderão ser doados.
  • O diagnóstico de morte encefálica faz parte da legislação nacional e do Conselho Federal de Medicina. Dois médicos em diferentes momentos examinam o paciente e fazem o diagnóstico clínico de morte encefálica. Um exame gráfico, como ultrassom com Doppler ou arteriografia e eletroencefalograma, é realizado para comprovar que o encéfalo já não funciona.
  • Os transplantes ocorrem através de uma cirurgia tradicional e, ao fim do procedimento, o corpo é reconstituído, podendo ser velado normalmente.
  • Os órgãos são transplantados para os primeiros pacientes compatíveis que estão aguardando em lista única da central de transplantes da Secretaria de Saúde de cada Estado. Esse processo, além de justo, é controlado pelo Sistema Nacional de Transplantes e supervisionado pelo Ministério Público.

Pamela Baldin

Pâmela Baldin é estudante de Jornalismo

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