Eu sinto vergonha alheia e você?

Cenas de vergonha alheia são infinitas e indiscutivelmente narráveis.

Quem nunca sentiu vergonha alheia mente. Ah, mente!

Último dia de férias com passeio no calçadão da capital do chopp pra matar o tempo. Aquela entradinha no mercado municipal é inevitável quando estou na companhia de minha mãe.

No calor de pleno inverno às três da tarde é bem comum que pessoas procurem um lugar para tomar uma bebida qualquer que cesse a sede. Bebida que logo pede aquela coxinha de frango ou qualquer um desses salgadinhos fritos no óleo de semanas. Foi o que presenciamos – minha mãe e eu. Um rapaz matava sua fome e sede debruçado no balcão de um botequinho de esquina. Enquanto isso, a atendente, aparentemente muito descontraída, conversava com a colega de trabalho. Eu continuava a observar os arredores como costumeiramente. Mercadão tem de tudo, não é?

De repente, uma cena fisgou minha atenção. Meus olhos correram ao encontro dos de minha mãe e a entoação daquele “creeedo!” veio completar nossa sensação.

O bate-papo das mocinhas devia estar bem agradável, creio eu, pois a que estava de frente para o rapaz – debruçada no balcão do lado de dentro – parecia bem solta e alegre. O cliente tinha o pensamento a milhares de milhas dali – ufa!. Possivelmente as belas falavam da festa do final de semana. Foi a conclusão a que cheguei depois de ver a balconista girando calmamente o indicador direito na narina do mesmo lado, como se fizesse a melhor “limpeza de salão” de sua vida. Fiquei olhando para aquilo sem saber se ria ou chorava, intimamente inconformada. Ao terminar, despreocupadamente e com um largo sorriso, ela friccionou delicadamente o polegar e o indicador em movimentos circulares, certamente produzindo um objeto esférico de caca recém-extraída, acomodando-o, em seguida, na manga esquerda da camiseta do uniforme.

Não! Eu não estou assistindo a isso, pensava. Que visão pavorosa!

A grande sorte do rapaz foi não ter tido a oportunidade de apreciar tão inesquecível espetáculo. Mas eu tive. Minha mãe teve. Nós fomos espectadoras daquele repugnante deleite. Não sei se ele terminaria de degustar aquela coxinha se tivesse atento ao que aconteceu bem a sua frente.

Aparei o queixo com uma das mãos e exclamei: nossa, mãe, que vergonha! E ela: você viu aquilo? Na frente do cliente!

A preocupação foi só nossa mesmo.

A moça, depois de limpar a mão no uniforme, continuou atendendo. O cliente permaneceu ali despreocupado. O que os olhos dele não viram o estômago não sentiu.

 

Lucimara Souza

Formada em Letras, Pedagogia e especialista em Comunicação: linguagens midiáticas, atualmente professora. Aprecia a escrita permeada pela criatividade, humor e certa dose de sarcasmo.

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